10/03/05

DO FALAR POESIA - 14

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Haverá um tempo «da frol»?*
Qual a estação mais propícia à poesia? Para o poeta, para o verdadeiro poeta, não há outra estação senão a da poesia. E dentro da poesia a primavera, o verão, o outono, o inverno. A poesia vive muito para lá da palavra, independente das costuras da linguagem. Vive junto a uma espécie de «miopia» reveladora. Por isso, sabemo-lo, é a única estação dos poetas. Uma estação orgíaca, onde os sons copulam com as imagens e os ritmos se cruzam com as ideias e o ar torna-se respiração e todas as estações se transformam numa única divisão cosmogónica. A poesia dá forma às ideias. Ela também é, nessa medida, método. Arrasta na sua cauda os mitos mais primitivos, o legado órfico. Arrasta-os para a orla de uma verdade inquieta. Porque cumpre o espírito fora dos edifícios de uma falsa verdade, dessa verdade que se reclama científica, racional, clara e evidente, sólida. Dessa verdade dos ditames, das regras, dos asfixiantes pressupostos da epistemologia, nada servirá ao poeta. Já que a poesia celebra o Eu. O Eu obscuro que apenas a poesia desvela. Mas esse Eu não é tão-somente o ego do poeta. É raro encontrarmos hoje uma poesia que não coloque o poeta num estado de urgência expressiva, no centro de todas as atenções. Parece-me que, mais tarde ou mais cedo, dar-se-á também na arte poética uma nova «revolução coperniciana». O poema deixará de andar à volta do poeta para que o poeta passe a andar em torno do poema. Porque só a poesia sabe conjugar, de forma absolutamente livre, os confins da solidão do poeta com o veneno das ideias cartografadas, ou seja, a expressão com a reflexão. É essencial que a revolução aconteça.


Henrique Fialho (juraan vink) -In http://www.universosdesfeitos.weblog.com.pt/
[*título meu ; imagem de mucha - 'poesia' ]

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