31/08/07

POETAS AMIGOS - 57

nunca percebi muito de vozes
mas se te ouço
mesmo quando é difícil entender
cada palavra
faço do corpo um espaço de silêncio


Maria Sousa – in http://www.theresonly1alice.blogspot.com/

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30/08/07

LEITURAS - 48

No alto tremeluzia uma estrelinha, a Vénus diamantina, lânguida anunciadora da noite e dos seus contentamentos. Jacinto nunca considerara demoradamente aquela estrela, de amorosa refulgência, que perpetua no nosso Céu católico a memória da deusa incomparável — nem assistira jamais, com a alma atenta, ao majestoso adormecer da Natureza. E este enegrecimento dos montes que se embuçam em sombra; os arvoredos emudecendo, cansados de sussurrar; o rebrilho dos casais mansamente apagado; o cobertor de névoa, sob que se acama e agasalha a frialdade dos vales; um toque sonolento de sino que rola pelas quebradas; o segredado cochichar das águas e das relvas escuras — eram para ele como iniciações. Daquela janela, aberta sobre as serras, entrevia uma outra vida, que não anda somente cheia do Homem e do tumulto da sua obra. E senti o meu amigo suspirar como quem enfim descansa.

Eça de Queirós, A Cidade e as Serras

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29/08/07

PENSAR - 68

"É preciso sonhar e continuar. É preciso continuar o duplo jogo e opor a ilusão à realidade e crer obstinadamente no próprio sonho e fazê-lo viver e sobreviver e continuar a alimentar esse sonho."


Cervantes, in "D. Quixote de La Mancha"

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28/08/07

LER OS CLÁSSICOS -72


img:Kandinsky

Trovas às desordens
que agora se costumam em Portugal


Não sei que possa viver
neste reino já contente,
pois a desordem na jente
nã quer leixar de creçer.

A qual vai tam sem medida,
que se não pode sofrer
nam ha hi quem possa ter
boa vida.

Outros nom tem moradia
mais de seis çent’reaes,
os quaes querem ser iguaes
cos fidalgos de valia.

Ja ninguém nã quer usar
da nobreza dos passados,
se nam vinte mil cruzados
ver se podem ajuntar.

Outros vão trazer atados
Hûs lencinhos no pescoço,
que cõ gram pedra nû poço
deviam de ser lançados.

Outros, sem ser mãçipados,
sendo menores de idade,
andam ja cõ vaidade
agravados.

Outros hã por cousa boa
nã ter homens ne cavalos,
e despreçã os vasalos
por se vire a Lixboa.

Os quaes, se fossem lebrados
das pendenças, e das guerras,
folgariam de ter terras,
e criados.

Em qualquer aldeazinha
achareis tal corruçam,
ca molher do escrivam
cuida que he hûa rainha.

E tam bem os lavradores
com suas mas novidades
querem ter as vaidades
dos senhores.

Em Roma, segundo lemos,
ordenaram dous çensores,
os quaes represores
dos vicios e dos estremas.

Assi no tempo presente
nam seria muito mal,
aver hi official
de desenganar a jente.

Duarte de Gama, in Cancioneiro Geral de Garcia de Resende (1516)

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27/08/07

NOCTURNOS - 36



Passando a noite no rio

A barca atraca na ilhota de bruma,
Crepúsculo: renasce a comoção do viajante.
Uma planura imensa; desce o céu às árvores,
Límpido, o rio: chega-se a lua aos homens.

Jiang-De

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26/08/07

DE AMICITIA - 60



Nas despedidas

Os amigos
deixam nos restaurantes
em vez dos endereços
a promessa de que regressarão sempre
à cidade onde os morangos
crescem nas bermas das estradas
e uma única laranja
iluminará para sempre
os corações indefesos
das crianças.

José Carlos Barros


- in Casa da Cacela -http://casa-de-cacela.blogspot.com/

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25/08/07

OMNIA VINCIT AMOR - 82


img : chagall

Forever

He was my North, my South, my East and West,
My working week and my Sunday rest,
My noon, my midnight, my talk, my song;
I thought that love would last for ever;
I was wrong.


Wystan Hugh Auden


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24/08/07

ESCREVER - 55



O tempo leva tudo e deixa-me apenas fragmentos sem forma: Escrever: tentar meticulosamente reter algo, causar que algo sobreviva ; arrancar alguns pedaços precisos do vácuo à medida que ele cresce , deixar algures um sulco, um traço, uma marca ou alguns poucos sinais.

Georges Perec

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23/08/07

REVIVALISMOS - 8

cartaz publicitário
( como eram bonitos estes cartazes, não eram?)

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OS MEUS POETAS - 78


foto de rui vale sousa

Hás-de lembrar-te que por aqui passei.
Era Janeiro e não tinha amigos.
Vinha de longe
e na mala trazia roupa suja
e alguns livros sem capa.

Dir-te-ei depois das lembranças
que hoje inda não sei.

Da surpresa
de dar pelo riso das crianças
e de não estranhar um ranço de embaraço
na aventura.

Poderia dizer-te tudo já.
Dizer-te o que não vai acontecer.

Revelar-te, enfim, como estar aqui não me pertence,
nem te pertence,
nem se prende a sábios loucos,
nem a santos revelados pelo martírio.

Poderia até dizer-te, hoje e aqui,
neste quarto de hotel,
(familiarmente pobre e sujo)
o quão pouco me basta pr’a resgatar o mundo:

é vir assim, ousadamente, conquistar duas horas de sol ao sudoeste.

Ruy de Carvalho

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22/08/07

IMPRESSÕES DE VIAGEM - 2

quotidianos

1.







2.






3.1- menino em Hoi An 2- aldeia flutuante-Seam Reap-Cambodja ;3-aldeia flutuante-menino vendendo bebidas aos turistas

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21/08/07

IMPRESSÕES DE VIAGEM -1












angkor vat (Cambodja)

Hanói: motorizada,meio de transporte mais usado















baía de Halong-(Vietname)


CAMBODJA E VIETNAME, 2007

A minha viagem ao Cambodja e Vietname, com passagem por Istambul (aeroporto) e Bangkok-foi muito cansativa - não havendo voos directos - fiz Lisboa-Istambul-Bangkok-Hanói + 2 internos no Vietname - Seam Rap/Angkor; no regresso idêntico percurso. Para além do mais, algumas deficiências na programação - cerca de umas 12 horas parados em hotéis + tempos de espera no avião. A agravar ainda, calor húmido de 40º ou mais de manhã à noite.
Gostei genericamente do que vi - paisagens belíssimas no Vietname (Halong, por ex.- na foto) e templos, pagodes, alguns museus e o complexo de Angkor (1080 templos budistas e hinduístas, dos quais vimos o mais importante e maior e mais uns 3;(ver foto) ); de passagem por Bangkok, mais 3 templos e jardins. (ver foto)
O que mais me impressionou: a grande miséria no Cambodja (onde os khmers vermelhos dizimaram 45% da população em 5 anos) e no Vietname - menos neste, mais desenvolvido, visto as guerras terem acabado há mais tempo e se ter aberto às multinacionais. É duro ver crianças a assediar turistas para lhes venderem coisas-postais, pequenas peças de artesanato, etc.; crianças de 3 anos, por exemplo cuja única palavra insistentement repetida é dollar,dollar,dollar. Tentam vender, mas não roubam.
Vi no Cambodja uma aldeia flutuante - casas leves que podem ser facilmente deslocadas de um sítio para outro. Miseráveis, sim - mas com escola primária e secundária, lojas,terraços com esplanadas e até igreja e campo de basket, flutuando.
Ou seja: tudo o que é humano vive miseravelmente (certamente que há gente mais rica, claro). No Vietname há cerca de 10% de automóveis. Sensivelmente o mesmo no Cambodja. E há milhões de bicicletas e motos no Vietname, o veículo privilegiado - em cada semáforo de Hanói ou Ho Chi Minh (Saigão) e noutras cidades mais pequenas, parecem concentrações de motards...e ninguém, mesmo as crianças, usa capacete. Tudo o que foi feito pelo homem (palácios, templos, pagodes) é muito bonito.

Fiz um cruzeiro magnífico numa das paisagens naturais mais belas que vi (para além de Iguaçú, no Brasil, e dos glaciares patagónicos): a baía de Hai Long, no norte do Vietname(perto de Hanói) -já património da humanidade.

São países, todos eles, praticamente sem indústria (têm da seda e não sei se mais ) e vivendo de uma agricultura pobre (arrozais) e da pesca. A saída está no desenvolvimento do turismo -maior já no Vietname (longa costa – praias ) do que no Cambodja. Há muitas árvores - porque as chuvas são frequentes- monções em certas zonas quase diárias - não aliviando sequer do extremo calor . E a maioria das populações não tem ar condicionado como nós tínhamos nos hotéis, barcos e autocarros...Muitos nem rede de esgotos, água canalizada e luz possuem, sobretudo nas pequenas localidades.
No Cambodja não há hospitais decentes e muito menos gratuitos.Em Seem Reap/Angkor vi um hospital pediátrico:oferta do governo suíço. E se o complexo de Angkor, património mundial e candidata às 7 maravilhas não foi eleito, dizia, com razão, o guia – é porque os cambodjanos não têm, na sua grande maioria, acesso à net para poder votar.
Falar destas coisas - é esquecer mesmo que as nossas dificuldades cada vez maiores de vida em Portugal, são nada ao pé destes povos, dos africanos ou indianos. Ou latino-americanos.

Obs.: quanto mais vejo dos países citados, mais admiração sinto por Madre Teresa de Calcutá, também ela natural de um país paupérrimo da Europa, mesmo que, por vezes, alguns coloquem em causa os seus métodos: - não se limitou a ter pena, viveu e morreu a pena dos mais infelizes dos homens. Eu apenas tenho pena – e quase nada ou mesmo nada faço de acordo com essa pena…a não ser ajudar o turismo, o grande recurso desses povos.

Colocarei ainda mais imagens, logo que me seja possível(das de agora só a 2ª é da minha autoria).

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20/08/07

DA EDUCAÇÃO - 29




Educação para a independência do pensamento


Não basta preparar o homem para o domínio de uma especialidade qualquer. Passará a ser então uma espécie de máquina utilizável, mas não uma personalidade perfeita. O que importa é que venha a ter um sentido atento para o que for digno de esforço, e que for belo e moralmente bom. De contrário, virá a parecer-se mais com um cão amestrado do que com um ser harmoniosamente desenvolvido, pois só tem os conhecimentos da sua especialização. Deve aprender a compreender as motivações dos ho­mens, as suas ilusões e as suas paixões, para tomar uma atitude perante cada um dos seus semelhan­tes e perante a comunidade.Estes valores são transmitidos à jovem geração pelo contacto pessoal com os professores, e não – ou pelo menos não primordialmente – pelos livros de ensino. São os professores, antes de mais nada, que desenvolvem e conservam a cultura. São ainda esses valores que tenho em mente quando reco­mendo, como algo de importante, as humanidades e não o mero tecnicismo árido, no campo histó­rico e filosófico.A importância dada ao sistema de competição e à especialização precoce, sob pretexto da utilidade imediata, é o que mata o espírito de que depende toda a actividade cultural e até mesmo o próprio florescimento das ciências de especialização.Faz também parte da essência de uma boa educação desenvolver nos jovens o pensamento crítico independente, desenvolvimento esse que é prejudicado, em grande parte, pela sobrecarga de discipli­nas em que o indivíduo, segundo o sistema adoptado, tem de obter nota de passagem. A sobrecarga conduz necessariamente à superficialidade e à falta de verdadeira cultura. O ensino deve ser de modo a fazer sentir aos alunos que aquilo que se lhes ensina é uma dádiva preciosa e não uma amarga obri­gação.

Albert Einstein - in Como vejo o mundo

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19/08/07

OS MEUS POETAS - 77

[UM OUTRO MODO DE OLHAR PARA DOMINGO]


foto:cartier-bresson

Domingo

Quando chega domingo,
faço tenção de todas as coisas mais belas
que um homem pode fazer na vida.

Há quem vá para o pé das águas
deitar-se na areia e não pensar...
E há os que vão para o campo
cheios de grandes sentimentos bucólicos
porque leram, de véspera, no boletim do jornal:
« Bom tempo para amanhã»...
Mas uma maioria sai para as ruas pedindo,
pois nesse dia
aqueles que passeiam com a mulher e os filhos
são mais generosos.
Um rapaz que era pintor
não disse nada a ninguém
e escolheu o domingo para se matar.
Ainda hoje a família e os amigos
andam pensando porque seria.
Só não relacionam que se matou num domingo!
Mariazinha Santos
(aquela que um dia se quis entregar,
que era o que a família desejava,
para que o seu futuro ficasse resolvido),
Mariazinha Santos
quando chega domingo,
vai com uma amiga para o cinema.
Deixa que lhe apalpem as coxas
e abafa os suspiros mordendo um lencinho que sua mãe lhe bordou,
quando ela era ainda muito menina...
Para eu contar isto
é que conheço todas as horas que fazem um dia de domingo!
À hora negra das noites frias e longas
sei duma hora numa escada
onde uma velha põe sua neta
e vem sorrir aos homens que passam!
E a costureirinha mais honesta que eu namorei
vendeu a virgindade num domingo
— porque é o dia em que estão fechadas as casas de penhores!

Há mais amargura nisto
que em toda a História das Guerras.

Partindo deste princípio,
que os economistas desconhecem ou fingem desconhecer,
eu podia destruir esta civilização capitalista, que inventou o domingo.
E esta era uma das coisas mais belas
que um homem podia fazer na vida!

Então,todas as raparigas amariam no tempo próprio
e tudo seria natural
sem mendigos nas ruas nem casas de penhores...

Penso isto, e vou a grandes passadas...
E um domingo parei numa praça
e pus-me a gritar o que sentia,
mas todos acharam estranhos os meus modos
e estranha a minha voz...
Mariazinha Santos foi para o cinema
e outras menearam as ancas
— ao sol
como num ritual consagrado a um deus!
—até chegar o homem bem-amado entre todos
com uma nota de cem na mão estendida...

Venha a miséria maior que todas
secar o último restolho de moral que em mim resta;
e eu fique rude como o deserto
e agreste como o recorte das altas serras;
venha a ânsia do peito para os braços!

E vou a grandes passadas
como um louco maior que a sua loucura...
O rapaz que era pintor
aconchegou-se sobre a linha férrea
para que a morte o desfigurasse
e o seu corpo anónimo fosse uma bandeira trágica
de revolta contra o mundo.
Mas como o rosto lhe estava intacto
vai a família ao necrotério e ficou aterrada!
Conheci-o numa noite de bebedeira
e acho tudo aquilo natural.
A costureirinha que eu namorei
deixava-se ir para as ruas escuras
sem nenhum receio.
Uma vez que chovia até entrámos numa escada.
Somente sequer um beijo trocámos...
E isto porque no momento próprio
olhava para mim com um propósito tão sereno
que eu, que dela só desejava o corpo bom feito,
me punha a observar o outro aspecto do seu rosto,
que era aquela serenidade
de pessoa que tem a vida cheia e inteira.
No entanto, ela nunca pôs obstáculo
que nesse instante as minhas mãos segurassem as suas.
Hoje encontramo-nos aí pelos cafés...
(ela está sempre com sujeitos decentes)
e quando nos fitamos nos olhos,
bem lá no fundo dos olhos,eu que sou homem nascido
para fazer as coisas mais heróicas da vida
viro a cabeça para o lado e digo:
— rapaz, traz-me um café...
O meu amigo, que era pintor,contou-me numa noite de bebedeira:
— Olha,
quando chega domingo,
não há nada melhor que ir para o futebol...
E como os olhos se me enevoassem de água,
continuou com uma vozque deve ser igual à que se ouve nos sonhos:
— ... no entanto, conheço um homem
que ia para a beira do rio
e passava um dia inteirinho de domingo
segurando uma cana donde caia um fio para a água...
um dia pescou um peixe,
e nunca mais lá voltou...
O pior é pensar:
que hei-de fazer hoje, que toda a gente anda alegre
como se fosse uma festa?...
—O rapaz que era pintor sabia uma ciência rara,
tão rara e certa e maravilhosa
que deslumbrado se matou.

Pago o café e saio a grandes passadas.
Hoje e depois e todos os dias que vierem,
amo a vida mais e mais
que aqueles que sabem que vão morrer amanhã!

Manuel da Fonseca - poeta e escritor neo-realista

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RETRATOS DE UM PAÍS QUE QUASE JÁ NÃO HÁ - 20


Tardes de domingo - encontros e ousadias-:).

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18/08/07

NOCTURNOS - 35




Noite única noite singular impressa

Noite única noite singular impressa
consagração das chuvas e das flores violadas

dos pássaros algemados em voo
dos silêncios por amor à voz
das alquimias pobres alquimias de oiro
das turbinas de aço onde as espadas escorrem

crescem árvores mais definitivas
pálpebras trémulas da noite

é o muro que eu recrio a cal sem vazios diários
todos de verdade nós todos férteis salvos

todos veias claras nós sementes
nós o susto fecundo de vivermos
nós os números e as letras e os desenhos

ah matem-me de noite punhais híbridos
sentinela das fronteiras extintas
sentinela última da noite



Luiza Neto Jorge

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17/08/07

POETAS MEUS AMIGOS - 58



memórias



não diziam nada

perpetuavam-se no silêncio
de memórias antigas
densas
como se alimentassem
escondidos sinais
dum tempo inocente
correndo alegrias
para um sol mais quente


tão só assim
diziam nada

voavam no silêncio pleno
que morava nas suas faces

António Cardoso Pinto

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02/08/07

...E eu vou buscar [na viagem] que consola
Um Oriente ao oriente do Oriente....


Álvaro de Campos,Opiário


[adaptado por mim para a circunstância.Vou de férias.Voltarei logo ...aliás um oriente a oriente do oriente é voltar ao ponto de partida...]

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01/08/07

OMNIA VINCIT AMOR - 81




Como perdemos um amor, afinal?

O ser amado vai-se afastando imperceptivelmente: um cansaço aqui, uma outra escolha acolá, tudo claro e justificado, às vezes com indignação. Até ao fim respondemos com ingenuidade. Ou talvez com fingida indiferença. E de um momento para o outro, encontramo-nos sós. Descobrimo-nos do lado de fora de tudo, atirados para a irremediável secura do deserto. Sós.

Rui Monteiro in http://ondemudar.blogspot.com/

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POEMAS COM ROSAS DENTRO - 41



de las generaciones de las rosas
que en el fondo del tiempo se han perdido
quiero que una se salve del olvido,
una sin marca o signo entre las cosas
que fueron. El destino me depara
este don de nombrar por vez primera
esa flor silenciosa, la postrera
rosa que Milton acercó a su cara,
sin verla. Oh tú bermeja o amarilla
o blanca rosa de un jardín borrado,
deja mágicamente tu pasado
inmemorial y en este verso brilla,
oro, sangre o marfil o tenebrosa
como en sus manos, invisible rosa.

Jorge Luis Borges

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