31/07/08

PÉROLAS - 140



A infância é uma insignificância eu sei
e apenas por a ter perdido a amamos tanto

Ruy Belo

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30/07/08

LEITURAS - 82




[de Cem anos de solidão ]


Muitos anos depois, diante do pelotão de fuzilamento, o coronel Aureliano Buendía haveria de recordar aquela tarde remota em que o pai o levou a conhecer o gelo. Macondo era então uma aldeia de vinte casas de barro e cana, construídas na margem de um rio de águas transparentes que se precipitavam por um leito de pedras polidas, brancas, enormes como ovos pré-históricos. O mundo era tão recente que muitas coisas ainda não tinham nome e para as mencionar era preciso apontar com o dedo. Todos os anos, pelo mês de Março, uma família de ciganos andrajosos montava a sua tenda perto da aldeia e, num grande alvoroço de apitos e timbales, davam a conhecer as novas invenções. [...]

Gabriel Garcia Marques,Cem anos de solidão -abertura .

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29/07/08

PENSAR - 81



A música perfeita tem a sua causa.
Nasce do equilíbrio.
O equilíbrio nasce do que é justo,
o que é justo nasce do sentido do mundo.
Por isso só se pode falar de música com alguém
que compreendeu o sentido do mundo.

Li Bou We in “Primavera e Outono”

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28/07/08

UMA ATITUDE SE IMPÕE- AFRONTAMENTO - 14



Amanhã

Amanhã fico triste,
Amanhã.
Hoje não.
Hoje fico alegre.
E todos os dias,
por mais amargos que sejam,
Eu digo:
Amanhã fico triste,
Hoje não.

Autor anónimo. Poema encontrado na parede de um dos dormitórios de crianças do campo de extermínio nazi de Auschwitz.

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27/07/08

DO FALAR POESIA - 83




O poema está em todo o lado. A tua voz
por vezes surge a seu lado
como o golfinho que por um pouco de sol
acompanha
uma galera dourada ao sol
e de novo desaparece. O poema está em todo
o lado
como as asas do vento dentro de vento
que tocaram as asas da gaivota por um instante.


Yorgos Seferis

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26/07/08

POETAS MEUS AMIGOS - 84



Miguel


Envias-me uma sombra
e eu sei que és Sol noutro lugar.



Constantino Mendes Alves

in http://diariopoetico.weblog.com.pt

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25/07/08

ANO VIEIRINO - 9




[Não debalde escolhe Cristo para o governo da sua casa um homem tão resoluto como Pedro.]



Todos os demónios do Inferno, diz Cristo que não prevalecerão contra sua Igreja: Portæ inferi non prævalebunt adversus eam. E porque não basta estarem as portas inimigas defendidas, se as próprias não estiverem seguras, à fidelidade de Pedro cometeu o Senhor as chaves do seu Reino: Tibi dabo claves regni cælorum. Primeiro lhe chamou homem de pedra e depois lhe entregou as chaves, porque as chaves do Reino só em homens de pedra estão seguras. Os homens de barro quebram, os de pau corrompem-se, os de vidro estalam, os de cera derretem-se; tão duro e tão constante há-de ser como uma pedra, quem houver de ter nas mãos as chaves do Reino: Tu es Petrus, tibi dabo claves.E qual há-de ser o ofício ou o exercício destas chaves? Fechar e abrir? Não diz isso o Senhor. As chaves que abrem e fecham, podem abrir para dentro e fechar para fora. Por isso vemos os tesouros tão estreitos e tão fechados para os outros, e tão largos e tão abertos para os que têm as chaves. Que havia logo de fazer com elas S. Pedro? Atar e desatar, diz Cristo: Quodcumque ligaveris, erit ligatum: quodcumque solveris, erit solutum. A peste do governo é a irresolução. Está parado o que havia de correr, está suspenso o que havia de voar; porque não atamos, nem desatamos. Não debalde escolhe Cristo para o governo da sua casa um homem tão resoluto como Pedro. Se Cristo lhe não mandara embainhar a espada, bem necessárias lhe eram as ataduras para as feridas. Assim há-de ser quem há-de obrar, e não homens que nem atam, nem desatam.

Padre António Vieira

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24/07/08

CAMONIANAS - 47




A três damas que lhe diziam que o amavam

MOTE

Não sei se me engana Helena,
se Maria, se Joana;
não sei qual delas me engana.

VOLTAS

Üa diz que me quer bem,
outra jura que mo quer;
mas em jura de mulher
quem crerá, se elas não crêem?
Não posso não crer a Helena
a Maria, nem Joana;
mas não sei qual mais me engana.

Üa faz-me juramentos
que só meu amor estima;
a outra diz que se fina;
Joana que bebe os ventos.
Se cuido que mente Helena,
também mentirá Joana;
mas quem mente não engana.


Luís de Camões, Rimas

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23/07/08

UMA ATITUDE SE IMPÕE- AFRONTAMENTO - 13



[…]

Eu não sou muito grande nasci numa aldeia
mas o país que tinha já de si pequeno
fizeram-no pequeno para mim
os donos das pessoas e das terras
os vendilhões das almas no templo do mundo
Sou donde estou e só sou português
por ter em portugal olhado a luz pela primeira
[ vez.

Ruy Belo

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22/07/08

LEITURAS- 81




"Se Emerence acreditava em algum facto, era no tempo, na sua mitologia pessoal, o tempo era a mó de um moinho eterno, cuja moega vazava os acontecimentos da vida no saco que cada um trazia. Ninguém lhe escapava, segundo a crença de Emerence, estava persuadida, mas sem compreender, que moía também o trigo dos mortos e enchia o seu saco, só que havia alguém que trazia a farinha às costas e coziam pão. O meu saco passou por aí uns bons três anos mais tarde, quando os seus sentimentos não se manifestavam já somente sob a forma de afecto, mas igualmente de uma confiança absoluta. Todos confiavam em Emerence, Emerence em ninguém, mais rigorosamente só dedicava umas migalhas de confiança aos seus eleitos, o tenente-coronel, eu, Polett, antigamente, o filho do irmão Józsi, alguns outros, recebendo uns isto, outros aquilo. Confiava a Adélka coisas que lhe diziam respeito, que ela compreenderia, julgava, dizia outras ao tenente-coronel, a Sutu ou ao biscateiro; a mim, no início, contara-me a morte dos gémeos, e só mais tarde soube que, sobre essa matéria, por exemplo, não dissera uma palavra ao sobrinho, que estava de boa fé de que Emerence só tinha um irmão, o seu pai. Como se de nós se quisesse vingar na sepultura, a ninguém se entregara em sua inteireza, devia divertir-se à nossa custa junto dos seus vizinhos mortos, enquanto nós tentávamos reconstruir a sua história, procurando cada um encaixar as respectivas informações nas dos outros. Com ela, levou, pelo menos, três dados essenciais, e podia dar-se por satisfeita, se nos visse, pois não conseguíamos explicar todos os factos e, pelos vistos, jamais conseguiríamos."

Magda Szabó,A Porta

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21/07/08

«ENSINOU A OBSERVAR EM VERSO» - 3



Contrariedades


Eu hoje estou cruel, frenético, exigente;
Nem posso tolerar os livros mais bizarros.
Incrível! Já fumei três maços de cigarros
Consecutivamente.

Dói-me a cabeça. Abafo uns desesperos mudos:
Tanta depravação nos usos, nos costumes!
Amo, insensatamente, os ácidos, os gumes
E os ângulos agudos.

Sentei-me à secretária. Ali defronte mora
Uma infeliz, sem peito, os dois pulmões doentes;
Sofre de faltas de ar, morreram-lhe os parentes
E engoma para fora.

Pobre esqueleto branco entre as nevadas roupas!
Tão lívida! O doutor deixou-a. Mortifica.
Lidando sempre! E deve a conta à botica!
Mal ganha para sopas...

O obstáculo estimula, torna-nos perversos;
Agora sinto-me eu cheio de raivas frias,
Por causa dum jornal me rejeitar, há dias,
Um folhetim de versos.

Que mau humor! Rasguei uma epopeia morta
No fundo da gaveta. O que produz o estudo?
Mais duma redacção, das que elogiam tudo,
Me tem fechado a porta.

A crítica segundo o método de Taine
Ignoram-na. Juntei numa fogueira imensa
Muitíssimos papéis inéditos.
A ImprensaVale um desdém solene.

Com raras excepções, merece-me o epigrama.
Deu meia-noite; e em paz pela calçada abaixo,
Um sol-e-dó. Chuvisca. O populacho
Diverte-se na lama.

Eu nunca dediquei poemas às fortunas,
Mas sim, por deferência, a amigos ou a artistas.
Independente! Só por isso os jornalistas
Me negam as colunas.

Receiam que o assinante ingénuo os abandone,
Se forem publicar tais coisas, tais autores.Arte?
Não lhes convém, visto que os seus leitores
Deliram por Zaccone.

Um prosador qualquer desfruta fama honrosa,
Obtém dinheiro, arranja a sua coterie;
E a mim, não há questão que mais me contrarie
Do que escrever em prosa.

A adulação repugna aos sentimentos finos;
Eu raramente falo aos nossos literatos,
E apuro-me em lançar originais e exactos,
Os meus alexandrinos...

E a tísica? Fechada, e com o ferro aceso!
Ignora que a asfixia a combustão das brasas,
Não foge do estendal que lhe humedece as casas,
E fina-se ao desprezo!

Mantém-se a chá e pão! Antes entrar na cova.
Esvai-se; e todavia, à tarde, fracamente,
Oiço-a cantarolar uma canção plangente
Duma opereta nova!

Perfeitamente. Vou findar sem azedume.
Quem sabe se depois, eu rico e noutros climas,
Conseguirei reler essas antigas rimas,
Impressas em volume?

Nas letras eu conheço um campo de manobras;
Emprega-se a réclame, a intriga, o anúncio, a blague,
E esta poesia pede um editor que pague
Todas as minhas obras...

E estou melhor; passou-me a cólera. E a vizinha?
A pobre engomadeira ir-se-á deitar sem ceia?
Vejo-lhe luz no quarto. Inda trabalha. É feia...
Que mundo! Coitadinha!


Cesário Verde

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20/07/08

PÉROLAS - 139






É somente à noite que as estrelas brilham.

Winston Churchill

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19/07/08

PENSAR - 80



(Fala a Loucura)



Que é a vida se lhe tirardes os prazeres? Na realidade, que é a vida, se lhe tirardes os prazeres? Merece, então, o nome de vida? Aplaudi-me, meus amigos. Ah! eu sabia que éreis demasiadamente loucos, isto é, demasiadamente sábios, para não serdes da minha opinião... Os próprios estóicos amam o prazer; não o saberiam odiar. Bem dissimulam, bem tentam difamar a volúpia aos olhos do vulgo, cobrindo-a das injúrias mais atrozes, mas isso não passa de simples esgares, pois tratam de afastar os outros, para eles próprios a poderem gozar com maior liberdade. Mas, em nome de todos os deuses, dizei-me, então, qual é o instante da vida que não é triste, aborrecido, enfadonho, insípido, insuportável, se não for misturado com o prazer, isto é, com a loucura. Podia contentar-me com o testemunho de Sófocles, esse grande poeta, jamais suficientemente louvado, e que de mim fez um tão belo elogio, quando disse: A vida mais agradável é a que se vive sem espécie alguma de prudência. Mas examinemos o caso pormenorizadamente.Antes de mais nada, quem negará a verdade, de que a infância, essa primeira idade do homem, é a mais alegre e a mais encantadora de todas as idades? Amam as crianças, beijam-nas, abraçam-nas, acarinham-nas, tomam cuidado com elas; o próprio inimigo não poderá deixar de as socorrer. Como explicar tudo isto? É que, desde o instante em que nascem, a natureza, essa mãe prudente, espalha à sua volta uma atmosfera de loucura, que encanta os que as criam, os liberta das suas mágoas, e atrai sobre estes pequeninos seres a generosidade e a protecção que necessitam.E a idade que sucede à infância, que encantos não tem aos olhos das gentes? Com que ardor se interessam por favorecê-la, ajudá-la, socorrê-la! Ora, quem dá, a essa idade encantadora, as graças que a fazem tão querida? Quem lhas dá, senão eu? Afasto dos jovens a sabedoria importuna, e espalho sobre eles o encanto sedutor dos prazeres. E, para que vos não convenceis que estou a falar um tanto no ar, considerai os homens, depois de terem atingido todo o seu crescimento, e quando a experiência das lições sofridas começou a incutir-lhes certa prudência. Assim que a beleza começa a fanar-se, a alegria acaba, as forças diminuem, as graças passam. À medida que se vão afastando de mim, a vida abandona-os, cada vez mais, até que, por último, chegam a essa velhice tão triste que é encargo para o próprio e para os outros.E, na verdade, não há mortal algum que possa suportar essa velhice, se as misérias da humanidade não me fizessem, uma vez mais, ir em seu auxílio. Tal como os deuses dos antigos poemas, que, quando os mortais estão prestes a perder a vida, os favorecem com qualquer metamorfose, eu também modifico os velhos que estão à beira do túmulo, e arrasto-os, tanto quanto me é possível, para a feliz idade da infância.Se há alguém que queira saber por que processos opero esta metamorfose, não faço disso mistério algum. Levo-os à nascente do Letes, que é nas Ilhas Afortunadas (porque nos Infernos corre só um pequeno afluente deste rio); aí, faço-os beber, a largos tragos, o esquecimento de todas as misérias desta vida. As suas inquietações e as suas tristezas dissipam-se, a pouco e pouco, e assim rejuvenescem.Mas, dir-me-eis, talvez, que pode acontecer que eles se excedam, que façam asneiras. Sem dúvida. E é a isso que se chama recair no estado infantil. Fazer disparates, fazer tolices, não é voltar de novo à infância?Não é pela falta de razão que esta idade nos diverte e nos encanta? Na realidade, uma criança que fosse tão prudente como um homem já feito, não seria detestada por todos, não seria em toda a parte tida como um monstro? O provérbio tem razão, quando diz: Detesto nas crianças a seriedade prematura.Quem poderia suportar a convivência de um velho que tivesse tanta presença de espírito como reflexão e experiência? Sou eu, portanto, que concedo ao velho o delírio que o faz disparatar; mas, ao mesmo tempo, é um delírio feliz que o afasta para longe de todas as inquietações, de todas as tristezas que atormentam o homem prudente. Agradável conviva, ele ainda sabe, com um copo na mão, festejar os seus amigos. Vive com alegria e mal sente o fardo da existência, que os mais robustos com dificuldade suportam.



Erasmo de Roterdão - in O Elogio da Loucura

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18/07/08

CAMONIANAS - 46



[Poetas inspiram-se em Camões]


Eu cantarei de amor tão fortemente
Com tal celeuma e com tamanhos brados
Que afinal teus ouvidos, dominados,
Hão de a força escutar quanto eu sustente.

Quero que meu amor se te apresente
- Não andrajoso e mendigando agrados,
Mas tal como é: - risonho e sem cuidados
Muito de altivo, um tanto de insolente.

Nem ele mais a desejar se atreve
Do que merece; eu te amo, e o meu desejo
Apenas cobra um bem que se me deve.

Clamo, e não gemo; avanço, e não ratejo;
E vou de olhos enxutos e alma leve

A galharda conquista do teu beijo.


Vicente de Carvalho

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17/07/08

DE AMICITIA - 78




Meu único amigo


só conseguia amar-te se falasse de mim
sem cessar

hoje vivo quase sempre sozinho
paciência
os momentos de infelicidade estão esquecidos

uma pétala de luz percorre as linhas da mão
o rosto é aquele que sonhei
e não o que a noite dos espelhos tenta dar-me

eis o retrato do meu único amigo
a quem tudo revelo
o que me cresceu no coração


Al Berto in O Medo

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16/07/08

Encontro inesperado em Sófia


Pois: deixei-vos com Pessoa, antes de partir e...encontrei Álvaro de Campos numa rua do centro histórico de Sófia, na Bulgária...talvez consigam ler o início de Tabacaria em búlgaro...




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POEMAS COM ROSAS DENTRO -55



My pretty rose tree

A flower was offered to me;
Such a flower as May never bore.
But I said I've a Pretty Rose-tree.
And I passed the sweet flower o'er.

Then I went to my Pretty Rose-tree:

To tend her by day and by night.
But my Rose turnd away with jealousy:
And her thorns were my only delight.

William Blake

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07/07/08

PAUSA BREVE NO BLOGUE




Viajar! Perder países!

Viajar! Perder países!
Ser outro constantemente,
Por a alma não ter raízes
De viver de ver somente!

Não pertencer nem a mim!
Ir em frente, ir a seguir
A ausência de ter um fim,
E da ânsia de o conseguir!

Viajar assim é viagem.
Mas faço-o sem ter de meu
Mais que o sonho da passagem.
O resto é só terra e céu.

Fernando Pessoa

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PÉROLAS - 138



Quando deponho sobre os teus dedos

Quando deponho sobre os teus dedos de frio
uma mão de grinalda e de sonhos
vejo o amanhã inscrito nos teus olhos.

Armando Artur(Moçambique)

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06/07/08

REVIVALISMOS -18




ou sugestão para uma tarde de domingo?

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OS MEUS POETAS - 91



Nantucket

Flores na janela roxo
-claro e amarelas

alteradas por cortinas brancas
—Cheiro a limpo

—Sol do entardecer —
Na bandeja de vidro

um jarro de vidro, o copo
voltado para baixo, e junto ao copo

uma chave

— E o branco leito imaculado

William Carlos Williams
tradução de José Agostinho Baptista, "Antologia Breve", Assírio & Alvim

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05/07/08

ESCREVER - 67




"Gosto das palavras que sabem a terra, a água, aos frutos de fogo no verão, aos barcos no vento; gosto das palavras lisas como seixos, rugosas como o pão de centeio. Palavras que cheiram a feno e a poeira, a barro e a limão, a resina."

Amos Oz
encontrado em http://aarquitecturadaspalavras.blogspot.com/

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04/07/08

DESASSOSSEGOS - 75



Encontro

Hesitámos por um momento
e pouco depois reconhecemos
que sofríamos da mesma doença.
Não existe definição
para esta maravilhosa tortura,
há quem lhe chame spleen
e quem fale em melancolia.
Mas se aceitamos o jogo
nas suas margens encontramos
um sinal inteligível
que pode dar sentido ao todo.

Eugenio Montale - Poesia - Diário Póstumo
tradução de José Manuel de Vasconcelos
Assírio & Alvim, Lisboa, Junho 2004

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03/07/08

POEMAS COM ROSAS DENTRO - 54


foto de fred matos

As rosas do tempo

Admirável espírito dos moços
a vida te pertence. Os alvoroços


as iras e entusiasmos que cultivas
são as rosas do tempo, inquietas, vivas

Erra e procura e sofre e indaga e ama
que nas cinzas do amor perdura e flama.

Carlos Drummond de Andrade

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02/07/08

LEITURAS - 80



«Retirou as pernas, deitou-se de lado sobre o braço e sentiu pena de si mesmo. Esperou apenas que Guerássim saísse para o quarto ao lado e sem se conter mais começou a chorar como uma criança. Chorou pelo seu desamparo, pela sua horrível solidão, pela crueldade dos homens, pela crueldade de Deus, pela ausência de Deus.
«Porque é que fizeste tudo isto? Por que me trouxeste aqui? Porquê, por que me atormentas tão horrivelmente?...»
Não esperava resposta e no entanto chorava porque não havia nem podia haver resposta. A dor voltou a aumentar mas ele não se mexeu nem chamou. Dizia a si mesmo: «Outra vez, bate mais! Mas porquê? Que te fiz eu, porquê?
Depois acalmou-se, parou não apenas de chorar, parou de respirar e todo ele se tornou atenção: como se escutasse não uma voz que falasse com sons, mas a voz da alma, a torrente de pensamentos que se erguia no seu íntimo.
[…]
Parou de chorar,, e voltando a cara para a parede ficou a pensar sobre a mesma coisa: porquê, para quê todo aquele horror?
Mas por mais que o pensasse não encontrava resposta. E quando lhe ocorria, como muitas vezes ocorria, a ideia de que tudo aquilo resultava de ele não ter vivido como devia. Logo recordava toda a justeza da sua vida e afastava essa ideia estranha…

Lev Tolstoi, A Morte de Ivan Ilitch- trad. De António Pescada, Publ.D.Quixote,2007

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01/07/08

NOCTURNOS - 55




Não me acordes

A noite deita-se comigo
na fenda do tempo

Os dedos do luar
penteando os cabelos do sonho

Oh, meu amor
podes passar pelo meu sonho
podes ficar no meu sonho
mas não me acordes


Yao Jingming

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