31/12/09

OS MEUS POETAS - 130


desenho de adão contreiras*

Cinco horas

Minha mesa no Café,

Quero-lhe tanto... A garrida
Toda de pedra brunida
Que linda e que fresca é!

Um sifão verde no meio
E, ao seu lado, a fosforeira
Diante ao meu copo cheio
Duma bebida ligeira.

(Eu bani sempre os licores
Que acho pouco ornamentais:
Os xaropes têm cores
Mais vivas e mais brutais).

Sobre ela posso escrever
Os meus versos prateados,
Com estranheza dos criados
Que me olham sem perceber...

Sobre ela descanso os braços
Numa atitude alheada,
Buscando pelo ar os traços
Da minha vida passada.

Ou acendendo cigarros,
- Pois há um ano que fumo -
Imaginário presumo
Os meus enredos bizarros.

(E se acaso em minha frente
Uma linda mulher brilha,
O fumo da cigarrilha
Vai beijá-la, claramente...)

Um novo freguês que entra
É novo actor no tablado,
Que o meu olhar fatigado
Nele outro enredo concentra.

É o carmim daquela boca
Que ao fundo descubro, triste,
Na minha ideia persiste
E nunca mais se desloca.

Cinge tais futilidades
A minha recordação,
E destes vislumbres são
As minhas maiores saudades...

(Que história de Oiro tão bela
Na minha vida abortou:
Eu fui herói de novela
Que autor nenhum empregou...).

Nos cafés espero a vida
Que nunca vem ter comigo:
- Não me faz nenhum castigo,
Que o tempo passa em corrida.

Passar tempo é o meu fito,
Ideal que só me resta:
P'ra mim não há melhor festa,
Nem mais nada acho bonito.

- Cafés da minha preguiça,
Sois hoje - que galardão! -
Todo o meu campo de acção
E toda a minha cobiça.


Paris, Setembro de 1915

Mário de Sá Carneiro
*imagem em margemdois.blogspot.com

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30/12/09

POETAS MEUS AMIGOS -119


monet - les nymphéas

Da transparência

Senhor libertai-nos do jogo perigoso da
[transparência
No fundo do mar de nossa alma não há
[ corais nem búzios
Mas sufocado sonho
E não sabemos bem que coisa são os sonhos
Condutores silenciosos canto surdo
Que um dia subitamente emergem
No grande pátio liso dos desastres

Carmen Cynira
http://petalasdealcachofra.blogspot.com/

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29/12/09

LEITURAS - 129


chagall, le cirque

[...]
Sempre ao rufar surdo do tambor o contorcionista se enrolava, sempre o volteador se fazia anunciar por uma fanfarra de trombetas. Augusto, porém, umas vezes era o silvo agudo de um violino, outras as notas trocistas de um clarinete que o acompanhavam durante o cabriolar de suas palhaçadas. Mas chegado o momento de cair em transe, os músicos, subitamente inspirados, perseguiam-no entre suas espirais de êxtase como corcéis grudados à plataforma de um carrossel tomado de loucura.Todas as noites ao aplicar o maquillage, Augusto discutia com seus botões. As focas, não importa o que fossem obrigadas a fazer, permaneciam sempre focas. O cavalo, um cavalo; a mesa, uma mesa. Augusto, embora permanecendo um homem, era obrigado a tornar-se em algo mais: tinha de assumir os poderes de um ser excepcional dotado de um excepcional talento. Tinha de fazer rir as pessoas. Não era difícil fazê-las chorar, tão-pouco fazê-las rir; descobrira isso há muito tempo, antes mesmo de ter sonhado entrar para o circo. Mais altas, porém eram as suas ambições - queria dotar os espectadores de uma alegria que se revelasse imperecível. Foi essa obsessão que primeiramente o levou a sentar-se aos pés da escada e simular o êxtase. Caindo, por mero acaso, na imitação de um transe - esquecera-se do que iria fazer a seguir. Quando voltou a si, um tanto confuso e em extremo apreensivo, encontrou-se a ser aplaudido freneticamente. No dia seguinte repetiu a experiência, desta vez com propósito deliberado, pedindo que o riso louco e absurdo que ele tão facilmente suscitava desse lugar àquela suprema alegria que tanto desejava transmitir. Contudo, apesar do quase fervor dos seus esforços, todas as noites o esperavam os mesmos aplausos delirantes. [...]

Henry Miller, O sorriso ao pé da escada - ed.Asa

(obs.:pode também ser lido na íntegra em http://aguarelast.blogspot.com/)

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28/12/09

PÉROLAS - 184



Garça Branca


Esse grande floco de neve
é uma garça branca que acaba de pousar no lago

[azul.
Imóvel, na extremidade de um banco de areia,
a garça branca
observa o inverno.

Li Po

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27/12/09

OMNIA VINCIT AMOR -137



Há sempre um pouco de loucura no amor. Mas há sempre um pouco de razão na loucura. E, para mim também, para mim que estou destinado à vida, às borboletas e às bolhas de sabão, e tudo o que a elas se assemelham entre os homens, parece-me ser quem melhor conhece a felicidade. Quando vê esvoaçar essas almas pequenas, leves e maleáveis, graciosas e brincalhonas, Zaratustra tem vontade de chorar e de cantar. Eu só poderia acreditar em um deus que soubesse dançar.

Aprendi a andar; desde então, deixo-me correr. Aprendi a voar, desde então não preciso mais que me empurrem para mudar de lugar. Agora sou leve, agora eu vôo… agora um deus dança em mim.

F.Nietzsche -Assim falava Zaratustra

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26/12/09

É NATAL



É Natal, nunca estive tão só.
Nem sequer neva como nos versos
do Pessoa ou nos bosques
da Nova Inglaterra.
Deixo os olhos correr
entre o fulgor dos cravos
e os diospiros ardendo na sombra.
Quem tem assim o verão
dentro de casa
não devia queixar-se de estar só,
não devia

Eugénio de Andrade, Rente ao Dizer

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25/12/09

HE NOITE DE NASCIMENTO




He noite de nascimento,
em que Deos mostrou seu dia.
He noite de gran memoria,
noite em dia convertida,
escuridão consumida
con gran resplendor de glória:
no meio mais luminosa
que no mundo nunca viste,
e de escura, fria e triste,
a mais doce e gloriosa.
Oh noite favorecida
de memorável coroa,
vista de Deos em pessoa,
começando humana vida!
dos anjos todos cercada,
dos elementos servida,
do Padre e Filho escolhida,
do Spirito Sancto espirada!

Gil Vicente, Auto da Fé
ouvir/ver de novo
http://www.youtube.com/watch?v=9GPeioF_1xk

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24/12/09

para uma noite especial

a noite de um menino sem-abrigo ...

PÉROLAS - 183




Jadis, si je me souviens bien, ma vie était un festin où s’ouvraient tous les cœurs, où tous les vins coulaient.Un soir, j’ai assis la Beauté sur mes genoux – Et je l’ai trouvée amère...
Rimbaud
encontrado em http://cortenaaldeia.blogspot.com/...
Em tempos – se bem me lembro, a minha vida era um festim em que todos os corações se abriam, onde todos os vinhos corriam.
Uma noite, sentei a Beleza nos meus joelhos – E achei-a amarga...

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23/12/09

NATAL


menino jesus da cartolinha
(miranda do douro)

Natal

Todos os anos à hora marcada
desces do céu onde é o teu lugar.
E logo o erro já me não diz nada
e fico a acreditar.

Aéreo encanto de uma voz perdida
no que de voz começa em ser criança,
nada de vida em ti é ainda vida,
e é o que não cansa.

Ficasses tu assim no que hás-de ser
e não seres nunca um homem por inteiro…
Porque o teu berço tem mais p'ra dizer
que o teu madeiro.

Fica-te aí, sorri, que tudo é vão
no mais que fores quando fores gente.
Toda a verdade está nessa ilusão
de estares presente.

Que o teu sorriso não é de ninguém;
nem é de ti, que inda o não sabes ser,
nem é dos outros, que já só o têm
em o estar a ver.

Mas perto e longe, por tê-lo e não tê-lo
é que tudo é belo.

Vergílio Ferreira

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22/12/09

OS MEUS POETAS - 129

Nevoeiro

Nem rei nem lei, nem paz nem guerra,
Define com perfil e ser
Este fulgor baço da terra
Que é Portugal a entristecer -
Brilho sem luz e sem arder
Como o que o fogo-fátuo encerra.

Ninguém sabe que coisa quer.
Ninguém conhece que alma tem,
Nem o que é mal nem o que é bem.
(Que ânsia distante perto chora?)
Tudo é incerto e derradeiro.
Tudo é disperso, nada é inteiro.
Ó Portugal, hoje és nevoeiro...

É a hora!


Valete, Fratres.

Fernando Pessoa. Mensagem

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21/12/09

NATAL NA INFÂNCIA



natal

A abstracção não precisa de mãe nem pai
nem tão pouco de tão tolo infante

mas o natal de minha mãe é ainda o meu nataL
com restos de Beira Alta

ano após ano via surgir figura nova nesse
presépio de vaca burro banda de música

ribeiro com patos farrapos de algodão muito
musgo percorrido por ovelhas e pastores

multidão de gente judaizante estremenha pela
mão de meu pai descendo de montes contando

moedas azenhas movendo água levada pela estrela
de Belém

um galo bate as asas um frade está de acordo
com a nossa circuncisão galinhas debicam milho

de mistura com um porco a que minha avó juntava
sempre um gato para dar sorte era preto

assim íamos todos naquela figuração animada
até ao dia de Reis aí estão

um de joelhos outro em pé
e o rei preto vinha sentado no

camelo. Era o mais bonito.
depois eram filhoses o acordar de prenda no

sapato tudo tão real como o abrir das lojas no dia
de feira

e eu ia ao Sanguinhal visitar a minha prima que
tinha um cavalo debaixo do quarto

subindo de vales descendo de montes
acompanhando a banda do carvalhal com ferrinhos

e roucas trompas o meu Natal é ainda o Natal de
minha mãe com uns restos de canela e Beira Alta.

João Miguel Fernandes Jorge, Actus Tragicus

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20/12/09

PÉROLAS - 182




Sossego


Sentado sozinho
com um copo na mão
contemplo
os montes distantes
Nem que chegasse

a amada
sentiria
prazer maior
Mesmo que não falem nem riam

gosto mais
das montanhas

Yun Sondo
(Coreia, 1587-1671)

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19/12/09

QUATRO POEMAS DE NATAL



[quarto]


A Estrela-a’Alva cintila,
São Nicolau vai chegar!

Me leva, minha mãe, me leva a Galipán!

Mãe, a lua, de tão tonta,
Passa roçando a montanha
E não pára a descansar!

Me leva, minha mãe, me leva a Galipán!

Eu quero colher no campo
A erva listada de prata,
A erva que de madrugada
Estava toda verdinha.

Me leva, minha mãe, me leva a Galipán!

É verdade que esta noite
Se às estrelas erradias
Eu pedir o que desejo,
O céu o concederá?
Diz-me, mãe, se é verdade,
Olha que quero pedir-lhes
Que tua máquina pare
E que tu não cosas mais.

Me leva, minha mãe, me leva a Galipán!

Iremos colher os pêssegos
Saborosos, os morangos
Vermelhos para comê-los
Com leite fresco...

Me leva, minha mãe, me leva a Galipán!

Partamos, mãe, sem demora.
Eu quero ser o primeiro
Para ver como lá chegam
Os Três magos a Belém.

Me leva, minha mãe, me leva a Galipán!

Que formoso o meu Natal!
Pêssegos grandes,
Erva de prata,
Moranguinhos vermelhos
Com leite fresco...
Encontrarei nos sapatos
O presente que ao céu peço:
Minha mãe não cosa mais!

Mãe, ainda que não queiras,
Irei hoje a Galipán!


Pablo Rojas Guardiã
(venezuelano)
Tradução de Manuel Bandeira

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18/12/09

PENSAR - 107



[O passado]


O passado é um labirinto e estamos nele, um passado não tem cronologia senão para os outros, os que lhe são estranhos. Mas o nosso passado somos nós integrados nele ou ele em nós. Não há nele antes e depois, mas o mais perto e o mais longe. E o mais perto e o mais longe não se lê no calendário, mas dentro de nós.
Vergílio Ferreira, in 'Estrela Polar'

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17/12/09

QUATRO POEMAS DE NATAL


[terceiro]

Desceu sobre os homens a doce paz das alturas,
E num estábulo, berço de pobreza e dor,
Após toda uma noite de maternas tonturas
Jesus caiu na terra, débil como uma flor.

A música das coisas alegrou as obscuras
Abóbadas do presepe e num hino de amor
Adoraram o menino as humildes criaturas:
Um burro com seu bafo, com sua flauta um pastor.

Depois os adivinhos de comarcas remotas
Ofertaram-lhe mirra, e em suas línguas ignotas
Ao pequeno chamaram Príncipe de Salém.

E enquanto no Levante, com revérberos vagos
Suavemente brilhava a estrela dos Reis Magos,
Os cordeiros olhavam para Jerusalém.


Victor Londoño (colombiano)
Trad. de Manuel Bandeira

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16/12/09

LI E RECOMENDO




Esta é uma história que a Júlia Guarda Ribeiro, nossa companheira de viagens no barco de flores, nos vem contar – ou por outra, conta às crianças, neste natal. Trata-se de uma excelente lição de sabedoria e, sobretudo, de paz e tolerância, ilustrada por Guilherme Correia e publicada pela editora Folheto, de Leiria. Segundo se lê na contracapa, a história é inspirada na peça do dramaturgo alemão Ephraim Lessing Nathan, der Weise, escrita e representada em 1779.
Fica a recomendação – para oferecer e ler em qualquer ocasião às crianças – Deveria, a meu ver, ser dada a ler lá onde as 3 religiões monoteístas nasceram...Também.
Folheto, Edições &Design - folheto@gmail.com
Tel/fax:244 815 198

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OS MEUS POETAS - 128




As Roseiras Silvestres Florescem

O mistério de um não encontro
tem desolados triunfos:
frases não ditas,
palavras silenciadas, olhares que não se cruzaram
nem souberam onde repousar -

(...)

Outros, talvez, descansem no sul,
divertindo-se no jardim do paraíso.
Aqui, estamos em pleno norte e, neste ano,
escolhi o outono como meu amigo.

(...)

Trouxe para cá lembranças abençoadas
de nosso último encontro, que não houve:
a fria, pura, leve chama
de minha vitória sobre o destino.


Anna Akhmátova (fragmento)
Trad.Lauro Machado Coelho

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15/12/09

ÓSCAR NIEMEYER


oscar niemeyer, n.1907 -
celebra hoje o seu 102ºaniversário

«Não é o ângulo reto que me atrai, nem a linha reta, dura, inflexível, criada pelo homem. O que me atrai é a curva livre e sensual, a curva que encontro nas montanhas do meu país, no curso sinuoso dos seus rios, nas ondas do mar, no corpo da mulher preferida. De curvas é feito todo o universo
, o universo curvo de Einstein.» - afirmou.

Para saber/ver(em imagens) mais:

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QUATRO POEMAS DE NATAL



[segundo]

Cristo, o Cristo menino,
Pisa, com pé desnudo,
A rosa proibida,
Pisa o áspero cravo.
Para Jesus menino
Nardo é espinho agudo.

Alvas vermelhas, céus
De algum entardecer
Teu destino anunciaram
Sangrento, Emanuel.

Em lágrimas o advertiam
A Virgem e José.

Tu nada mais olhavas:
O pássaro caindo,
A nuvem fatigada,
A estrela de Israel.


González Carballo (argentino)
Trad. de Manuel Bandeira

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14/12/09

NOCTURNOS - 78




Passeio no Lago Dongting

Noite de Outono,
ausência de bruma nas águas do lago.
Ondas capazes de me conduzir ao céu.
Deixo-me levar por um raio de luar
e, quando minha barca subir no firmamento,
comprarei vinho junto às nuvens brancas.

Li Bai

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13/12/09

ADESTE FIDELES

Como não consigo introduzir vídeos aqui, deixo a recomendação e remeto para



http://www.youtube.com/watch?v=9GPeioF_1xk



Adeste fideles

(cantado por Enya)


Adeste Fideles
Laeti triumphantes
Venite, venite in Bethlehem
Natum videte
Regem angelorum
Venite adoremus,
Venite adoremus,
Venite adoremus,
Dominum

Cantet nunc io
Chorus angelorum
Cantet nunc aula caelestium
Gloria, gloriaIn excelsis Deo
Venite adoremus,
Venite adoremus,
Venite adoremus,
Dominum

Ergo qui natus
Die hodierna Jesu,
tibi sit gloria Patris aeterni
Verbum caro factus
Venite adoremus,
Venite adoremus,
Venite adoremus,
Dominum

(tradicional e de autoria incerta)

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QUATRO POEMAS DE NATAL



[primeiro]

Teus olhos
Juntam as mãos
Como as madonas
De Leonardo.

Os bosques do ocaso,
As frondes amoradas
De um Renascimento sombrio.

O rebanho do mar
Bale para a gruta
Do céu cheio de anjos.

Deus encarna-se
Num menino que busca os brinquedos
De tuas mãos.

Teus lábios
Dão o calor que negam
A vaca e o burro.

E na penumbra
Tua cabeleira afofa as suas palhas
Para o Deus Menino.

Rafael de la Fuente
(peruano)

Obs.:este é o 1º de 4 poemas de Natal traduzidos por Manuel Bandeira.Outros se lhe seguirão...Agradeço à amiga que mos deu a conhecer.

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12/12/09

DO FALAR POESIA - 107



Nunca vivi no campo. Como outros, nem sequer a planície visitei, a não ser por curtos períodos de tempo. Não obstante escrevi um poema sobre o campo e dei-lhe aquilo que os meus versos lhe devem. Esse poema pouco vale. Nada existe menos sincero do que ele; uma total mentira.

Agora ocorre-me, porém, o seguinte: tratar-se-á, realmente, de uma falta de sinceridade? Não estará a arte sempre a mentir? Melhor dizendo, não será ela tanto mais criativa quanto mais mente? Quando escrevi aqueles versos, não estariam a ser produto da arte? (Não serem perfeitos talvez se não deva a uma falta de sinceridade, pois muitas vezes falhamos tendo por matéria-prima a mais sincera das impressões.) Na altura em que fiz aqueles versos haveria em mim sinceridade artística? Não estaria eu a pensar de uma forma que era como se vivesse, de facto, no campo?

konstandinos kavafis,páginas íntimas
trad. joão carlos chainho

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11/12/09

POETAS AMIGOS- 118



Quietude



A estranha nostalgia de um tempo
e de um lugar onde nada acontece. Um cântaro
com água reverbera o silêncio das nascentes
ou das raízes obscuras das folhosas.
Uma criança corre desamparada no terreiro
do largo e tudo fica suspenso desse voo contra
a inverosímil quietude dos nomes.

José Carlos Barros

in http://casa-de-cacela.blogspot.com/

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10/12/09


Nem oito,nem oitenta
ou por outra: nem 25000, nem 250000
mas
205000

visitantes. Obrigada, marinheiros deste barco!

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CONVÉM LEMBRAR



Declaração Universal dos Direitos do Homem
(excertos)

Preâmbulo


Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis constitui o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo;
(...)
Considerando que, na Carta, os povos das Nações Unidas proclamam, de novo, a sua fé nos direitos fundamentais do homem, na dignidade e no valor da pessoa humana, na igualdade de direitos dos homens e das mulheres e se declararam resolvidos a favorecer o progresso social e a instaurar melhores condições de vida dentro de uma liberdade mais ampla;
(...)
Considerando que uma concepção comum destes direitos e liberdades é da mais alta importância para dar plena satisfação a tal compromisso:

A Assembleia Geral
Proclama a presente Declaração Universal dos Direitos do Homem como ideal comum a atingir por todos os povos e todas as nações, a fim de que todos os indivíduos e todos os órgãos da sociedade, tendo-a constantemente no espírito, se esforcem, pelo ensino e pela educação, por desenvolver o respeito desses direitos e liberdades e por promover, por medidas progressivas de ordem nacional e internacional, o seu reconhecimento e a sua aplicação universais e efectivos tanto entre as populações dos próprios Estados membros como entre as dos territórios colocados sob a sua jurisdição.

ARTIGO 1.ºTodos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade.

ARTIGO 2.ºTodos os seres humanos podem invocar os direitos e as liberdades proclamados na presente Declaração, sem distinção alguma, nomeadamente de raça, de cor, de sexo, de língua, de religião, de opinião política ou outra, de origem nacional ou social , de fortuna, de nascimento ou de qualquer outra situação.
ARTIGO 3.ºTodo o indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.ao reconhecimento em todos os lugares da sua personalidade jurídica.(...)
ARTIGO 7.ºTodos são iguais perante a lei e, sem distinção, têm direito a igual protecção da lei. Todos têm direito a protecção igual contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação.(...)
ARTIGO 9.ºNinguém pode ser arbitrariamente preso, detido ou exilado.

(promulgada em 10 de Dezembro de 1948)

e...no entanto,61 anos depois, estes princípios permanecem como um doce projecto e afirmação de liberdade e dignidade humanas, sonhado também por tantos de nós...

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09/12/09

DESASSOSSEGOS - 100



Fica ao menos o tempo de um cigarro, evita

comigo que este tempo ande. Lá fora estão as
casas, vive gente perto do candeeiro, o som
que nos chega apagado pela distância só
denuncia o nosso silêncio interrompido.
Ajuda-me, faremos o inventário das coisas
que quisemos fazer e não fizemos, mágoas
que deixámos esquecidas entre o ruído das
cidades. Fica, não te aproximes, nenhum
dia é menos sombrio, quando anoitecer vamos
ver as árvores caminhando cercando a casa.

Hélder Moura Pereira

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08/12/09

OMNIA VINCIT AMOR - 136

Eu te comprei, embora muito caro,
um pouco de não sei quê, bem perfumado
porque o odor tantas vezes me ensina o caminho.
Onde quer que estejas, ali também estarei,
sem dúvida disso estou certo e convencido.
Se te escondes de mim, te perdoo :
levando-o sempre contigo, onde quer que vás,
hei de encontrar-te, mesmo que esteja cego.

Michelangelo Buonarroti

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07/12/09

OS MEUS POETAS - 127



Antes o voo da ave, que passa e não deixa rasto,
Que a passagem do animal, que fica lembrada

[no chão.
A ave passa e esquece, e assim deve ser.
O animal, onde já não está e por isso de nada serve,
Mostra que já esteve, o que não serve para nada.

A recordação é uma traição à Natureza.
Porque a Natureza de ontem não é Natureza.
O que foi não é nada, e lembrar é não ver.

Passa, ave, passa, e ensina-me a passar!


(7-5-1914)

Fernando Pessoa.Alberto Caeiro

"O Guardador de Rebanhos –XLIII

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06/12/09

APONTAMENTOS

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05/12/09

PÉROLAS - 181



Caminhando na praia
Olho para trás –
nem uma só pegada.

Hosar Ozaki (1885-1926)

Encontrado em http://www.umbigodosonho.blogspot.com/

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04/12/09

ESCREVER - 86



[Escrevo simplesmente. Como quem vive.]

“Eu disse uma vez que escrever é uma maldição. Não me lembro por que exatamente eu o disse, e com sinceridade. Hoje repito: é uma maldição, mas uma maldição que salva.”
in A descoberta do mundo

“O indizível só me poderá ser dado através do fracasso de minha linguagem."
in A paixão segundo G.H.

“Escrevo simplesmente. Como quem vive. Por isso todas as vezes que fui tentada a deixar de escrever, não consegui. Não tenho vocação para o suicídio.”

“Escrevo-te em desordem, bem sei. Mas é como vivo. Eu só trabalho com achados e perdidos.”
in Água-viva
Clarice Lispector - excertos

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03/12/09

DESASSOSSEGOS - 99



Não sei sobre pássaros,
não conheço a história do fogo.
Mas creio que minha solidão deveria ter asas.


Alejandra Pizzarnik
encontrado em theresonly1alice.blogspot.com/

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02/12/09

FARIA ANOS HOJE...

Maria Callas. (1923 - 1977)



Ver, entre outros existentes no youtube
http://www.youtube.com/watch?v=KK-EZqAzoTo
Disse:
«Il vaut mieux être une bonne chanteuse populaire qu’une mauvaise chanteuse d’opéra.»

«Mais vale ser uma boa cantora popular que uma má cantora de ópera»

Não foi o caso.Ela deu-nos e continua a dar-nos a arte do melhor instrumento musical: a voz humana .

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OMNIA VINCIT AMOR - 135


[Este amor]

Este amor que nos jorra - jorra e queima
em paixão que flutua ou já guerreia
contra si próprio se tornado cinza,
contra o destino se tornado areia...

Este amor é dilúvio - é fora e dentro
mesmo se sabendo que é candeia
a esmorecer em bruma, ao fogo lento
de nos deixar a dor quando se enleia

à nossa desrazão, ao fim do entendimento,
à ambígua amarração de luz e de tormento
nestas bolsas de sal às vezes cheias.

Este amor é de carne - é foz patente
de um rio sempre a crescer, sempre na esteira
do que tão perto está mesmo se ausente.

João Rui de Sousa, Obra poética

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01/12/09

NOS 75 ANOS DA PUBLICAÇÃO DE «MENSAGEM»


img-JJoaolroth

Prece

Senhor, a noite veio e a alma é vil.
Tanta foi a tormenta e a vontade!
Restam-nos hoje, no silêncio hostil,
O mar universal e a saudade.

Mas a chama, que a vida em nós criou,
Se ainda há vida ainda não é finda.
O frio morto em cinzas a ocultou:
A mão do vento pode erguê-la ainda.

Dá o sopro, a aragem - ou desgraça ou ânsia -,
Com que a chama do esforço se remoça,
E outra vez conquistemos a Distância -
Do mar ou outra, mas que seja nossa!


Fernando Pessoa .Mensagem
publ.em 1 de dezembro de 1934

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LI E RECOMENDO


Em litorais longínquos
as mulheres deitam-se sobre a areia
junto à rebentação das ondas.
Com os braços em cruz
afastam as embarcações costeiras
e aguardam que a lua inteira
inicie um inesperado bailado
perto de suas bocas.
E não há âncora nem cais
que emudeça o júbilo dos mastros.


Graça Pires em O silêncio: lugar habitado
Prémio Nacional Ruy Belo
Editora Labirinto,2009

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