09/02/10

DO FALAR POESIA -108



No livro do imaginário, a lua é verde de morrer, as cadeiras brancas,
e a terra amarela começa a dormir — gosto dos poetas obscuros.
Não há poetas obscuros.
Se alguém diz — esta atenção não é minha — não é um poeta obscuro?,
e se diz — esta não é a minha atenção — não é um poeta claro?
Não.
É difícil encontrar chaves — às vezes é fácil, às vezes difícil.
Não.
Cada imagem é a chave de outra imagem — e elas abrem-se umas
às outras, as imagens.
Não.
Tudo são chaves para abrir tudo.
Não.
A chave entra na fechadura, a porta abre-se sobre uma nova porta.
Não.
Portas sobre portas, até que a porta final abre sobre a luz que
atravessa o espaço aberto de todas as portas.
Não.Os poetas são metafísicos.
Não.
A metafísica é uma distância de onde os poetas vêem, em perspectiva,a realidade.
Não.
Não há realidade?
Não, não há realidade — todos os poetas são claros a esse respeito.
Se eles dizem — atenção — cria-se a realidade da atenção.
Se eles dizem — atenção — anulam a atenção, criam um espaço vazio.
A imagem não é uma realidade?
O que os poetas provam é que é preciso uma imagem para revelar
que a realidade não existe.
No livro do imaginário, a lua é verde de morrer, as cadeiras brancas,
e a terra amarela começa a dormir — gosto dos poetas claros.
Não, ainda não.


Herberto Helder, Photomaton & Vox

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