31/12/10

LEITURAS - 155


Photobucket

..“ Há magia no amor e nos sorrisos. Usem-nos todos os dias, em tudo o que fizeram, e verão as coisas maravilhas que acontecem”, costumava dizer a Coruja Castanha a ler do seu livrinho. Eu acreditara naquele slogan; acreditara que a ausência de coisas maravilhosas a acontecerem se devia ao meu próprio fracasso, ao meu insuficiente amor. Agora parecia-me que se podia substituir “amor” nesta máxima pelo nome de um verniz de móveis sem violar de forma alguma o seu significado. O amor era apenas um utensílio; os sorrisos eram outros tantos utensílios, eram apenas utensílios para se atingirem determinados objectivos. Não era magia, apenas química. Senti que de facto nunca amara ninguém, nem Paul, nem Chuck, o Porco-Espinho-Real, nem mesmo Arthur . Envernizara-os com o meu amor e esperara que brilhassem tanto que reflectissem a minha própria imagem, aumentada e cintilante.

Margareth Atwood
Encontrado em http://www.theresonly1alice.blogspot.com/

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30/12/10

POETAS MEUS AMIGOS - 144

cahier d'ecolier
img:cadernitos

[as palavras]

As palavras levam a vertigem das falésias, as carícias do mar
e o mosto engenhoso em que levedaram.

Lê-as com a atenção do marinheiro,
também no silêncio do provador de vinho.

As palavras também são desenhos dos meninos no bafo das janelas.
E as janelas são mar de vidro para as crianças sonharem.


Zef(erino) Silva

que escreve também em http://vozromazeira.blogspot.com/

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29/12/10

DE AMICITIA -102

carpe diem

Um Amigo

Há uma casa no olhar
de um amigo.
Nela entramos sacudindo a chuva.
Deixamos no cabide o casaco
fumegando ainda dos incêndios do dia.
Nas fontes e nos jardins
das palavras que trazemos
o amigo ergue o cálice
e o verão
das sementes.
Então abre as janelas das mãos para que cantem
a claridade, a água
e as pontes da sua voz
onde dançam os mais árduos esplendores.

Um amigo somos nós, atravessando o olhar
e os véus de linho sobre o rosto da vida
nas tardes de relâmpagos e nos exílios,
onde a ira nómada da cidade arde
como um cego em busca de luz.

Eduardo Bettencourt Pinto
(via webclub -http://wind9.blogspot.com/2010/11/um-amigo.html)

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28/12/10

OMNIA VINCIT AMOR - 155

gay

E uma abelha pousa no azul do lírio, e no cardo
que sobreviveu à geada.
Penso em ti...
Bebo, fumo, mantenho-me atento, absorto
– aqui sentado, junto à janela fechada.
Ouço-te ciciar amo-te pela primeira vez.
e na ténue luminosidade que se recolhe ao horizonte
acaba o corpo.
Recolho o mel, guardo a alegria, e digo baixinho:
Apaga as estrelas,
vem dormir comigo no esplendor da noite do mundo
que nos foge.

Al Berto, in "Lunário"

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27/12/10

LEITURAS - 154

autores

Diálogo entre Sidarta e Govinda, seu amigo

- Sidarta – disse então – ficamos velhos. É pouco provável que nos tornemos a ver sob esta forma da nossa existência. Vejo, meu querido, que encontraste a paz. Confesso que eu não consegui localizá-la. Dize-me mais uma palavra, ó Venerando. Dá-me algo que eu possa levar comigo, alguma coisa que me seja possível entender e assimilar durante a minha jornada. Olha, Sidarta, esse meu caminho é às vezes bastante laborioso e sombrio.


Sidarta permaneceu calado. Limitou-se a fitar o outro com aquele seu sorriso plácido. Govinda cravou os olhos no rosto do amigo. No seu olhar, liam-se angústia, saudade, sofrimento, tanto como contínua busca, contínuo desencontro.
Sidarta percebeu-o e sorriu:
-Acerca-te de mim! – soprou ao ouvido de Govinda. –
Inclina-te mais! Mais ainda. Chega-te para bem perto de mim! E agora me dá um beijo na testa, ó Govinda!
Govinda pasmou-se, mas, atraído por sua grande afeição e por algum pressentimento, obedeceu ao desejo de Sidarta. Achegando-se a ele, imprimiu-lhe os lábios na fronte. E nesse instante aconteceu-lhe qualquer coisa singular. Enquanto os seus pensamentos ainda se detinham nas palavras estranhas, proferidas por Sidarta; enquanto seu espírito se esforçava, relutante e improficuamente, por eliminar o tempo e por representar-se a unidade de Nirvana e Sansara; enquanto no seu íntimo certo desdém pelas opiniões do amigo se debatiam com irrestrita ternura e reverência, deu-se com ele o seguinte fenômeno:
Govinda já não enxergava o semblante de Sidarta, seu companheiro. Em vez dele via outros rostos, inúmeros, toda uma fila, uma torrente de rostos, centenas, milhares, que todos eles apareciam, sumiam e todavia davam a impressão de estar presentes simultaneamente, rostos esses que a cada instante se modificavam e renovavam e, contudo, eram sempre Sidarta. Via a cabeça de um peixe, uma carpa, com a boca semi-aberta em infinita dor, peixe agonizante, de olhos vidrados. Via o rostinho de uma criança recém-nascida, vermelho, enrugado, a ponto de chorar. Via a fisionomia de um assassino, no momento em que varava com a faca o corpo de sua vítima e, ao mesmo tempo, via esse criminoso a ajoelhar-se, algemado, para que o algoz o decapitasse com um só golpe de terçado. Vias os corpos desnudos de homens e mulheres, entrelaçados em posições e embates de desvairado amor. Via cadáveres prostrados, imóveis, gélidos, vazios. Via cabeças de animais, de javalis, crocodilos, elefantes, touros, aves. Via divindades, Krishna , Agni...Via todos esses vultos e rostos ligados entre si por milhares de relações, cada qual a acudir o outro, a amá-lo, a odiá-lo, a destruí-lo, a pari-lo de novo. Cada qual expressava o desejo de morrer, era apaixonada e dolorosa a profissão de efemeridade e, no entanto, não morria, apenas se modificava, renascia uma e outra vez, tomava aspectos sempre diversos, sem que o tempo se intercalasse entre uma e outra configuração. E todos esses rostos repousavam, flutuavam, geravam-se mutuamente, esvaiam-se e confundiam-se. Mas por cima deles, sem exceção, estendia-se uma camada fininha, irreal e todavia existente, qual tênue chapa de vidro ou de gelo, camada transparente, casca, molde, máscara de água. Pois, essa máscara morria, e essa máscara era o rosto risonho de Sidarta, que ele, Govinda, neste momento, tocava com os lábios. E Govinda percebeu que esse sorriso da máscara , o sorriso da unidade acima do fluxo das aparências, o sorriso da simultaneidade muito além do sem-número de nascimentos e mortes, o sorriso de Sidarta, era idêntico àquele sorriso calmo, delicado, indevassável, talvez bondoso, talvez irônico, de Gotama, o Buda, tal como ele próprio o observara centenas de vezes com profundo respeito. Era assim – Govinda o sabia – que sorriam os seres perfeitos.
Tendo perdido a noção do tempo, já não sabendo se aquela visão durara um segundo ou um século, ignorando se já existiam Sidarta, Gotama, o eu e o tu, com as entranhas como que atravessadas por uma seta divina, cuja ferida tivesse doce sabor, com a alma enfeitiçada e confusa, detinha-se Govinda por mais alguns instantes. Inclinava-se por sobre o rosto plácido de Sidarta, no qual vinha de depositar um beijo, e que acabava de ser o cenário de todas aquelas formas, evoluções e existências. O semblante não se modificara, depois que, sob a sua superfície, tornara a fechar-se o abismo da infinita multiplicidade. Sorria silenciosamente, suavemente, ternamente, talvez com bondade,talvez com ironia, assim como outrora sorrira o Sublime.
Govinda curvou-se em genuína reverência. Lágrimas de que não se dava conta corriam-lhe pelas faces idosas. No seu coração ardia, qual fogo, o sentimento de caloroso amor e de submissa veneração. Profundamente, até o chão, inclinou-se Govinda diante de Sidarta, que se conservava sentado, imóvel, e cujo sorriso chamava à memória do amigo tudo quanto ele amara no curso da sua vida, tudo quanto já se lhe afigurara precioso e sagrado.

Herman Hesse - Siddharta

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26/12/10

E AINDA...

UM CORDEL sobre o Natal

Como sabemos, o 'cordel' é um tipo de poema narrativo tradicional / popular no Brasil.Aqui fica um 'de natal'.

http://www.youtube.com/watch?v=wVTrNzPuem4&feature=player_embedded#!

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25/12/10

OS MEUS POETAS - 200

natureza

Poema de Natal

Não digo do Natal – digo da nata
do tempo que se coalha com o frio
e nos fica branquíssima e exacta
nas mãos que não sabem de que cio

nasceu esta semente; mas que invade
esses tempos relíquidos e pardos
e faz assim que o coração se agrade
de terrenos de pedras e de cardos

por dezembros cobertos. Só então
é que descobre dias de brancura
esta nova pupila, outra visão,

e as cores da terra são feroz loucura
moídas numa só, e feitas pão
com que a vida resiste, e anda, e dura.

Pedro Tamen

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24/12/10

o meu Natal é ainda o Natal de minha mãe

efemérides.natal


A abstracção não precisa de mãe nem pai

nem tão pouco de tão tolo infante

mas o natal de minha mãe é ainda o meu natal
com restos de Beira Alta

ano após ano via surgir figura nova nesse
presépio de vaca burro banda de música

ribeiro com patos farrapos de algodão muito
musgo percorrido por ovelhas e pastores

multidão de gente judaizante estremenha pela
mão de meu pai descendo de montes contando

moedas azenhas movendo água levada pela estrela
de Belém

um galo bate as asas um frade está de acordo
com a nossa circuncisão galinhas debicam milho

de mistura com um porco a que minha avó juntava
sempre um gato para dar sorte era preto

assim íamos todos naquela figuração animada
até ao dia de Reis aí estão

um de joelhos outro em pé
e o rei preto vinha sentado no

camelo. Era o mais bonito.
depois eram filhoses

o acordar de prenda no
sapato

tudo tão real como o abrir das lojas no dia
de feira

e eu ia ao Sanguinhal visitar a minha prima que
tinha um cavalo debaixo do quarto

subindo de vales descendo de montes
acompanhando a banda do Carvalhal com ferrinhos

e roucas trompas o meu Natal é ainda o Natal de
minha mãe com uns restos de canela e Beira Alta.

João Miguel Fernandes Jorge, in Actus Tragicus (1979)

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Um Natal português



Podia ter escolhido outra canção de natal; esta é portuguesa e é uma daquelas de que nais gosto e me faz recordar os tempos em que acreditava na vinda do menino jesus e não de um pai natal vestido de vermelho e de longas barbas brancas...
Para todos, uma boa e doce noite de natal no aconchego de um lar que não seja como o de Pessoa ao falar,desalentadamente, no seu poema Natal, de «E como é branca de graça/A paisagem que não sei,/Vista de trás da vidraça/de um lar que nunca terei».

Tê-lo-ão, por certo,e é esse o meu desejo maior, os amigos que comigo têm navegado neste barco de flores.E todos os meninos do mundo.

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23/12/10

POETAS MEUS AMIGOS - 143

estados de alma

Sabés vos lo que es el sueño?

Sabés vos lo que es el sueño?
¿Lo sabés en serio?

Del dolor, del más puto* dolor,
ése que te deja sin restos a veces
y te falta todo para volver a casa
ocupando un cuerpo de persona
es lo que te saca con su musiquita dulce
y hace que tu cuerpo sea cálido
y la voz no se te quiebre.


* neste caso «puto dolor» significa dor excessiva,profunda

Carlos Alberto Roldan
coordena o grupo utopoesia - http://ar.groups.yahoo.com/group/utopoesia/
«Poesía de los que no aceptan la exclusión como paisaje. Poesía para diseñar la utopía.» - que recomendo

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22/12/10

LER OS CLASSICOS - 136

autores


Ao que, por culpa tua, chegou a minha alma,
Lésbia! Até que ponto, pela sua fidelidade,
ela se perdeu! Já te não pode
querer bem, ainda que te tornes
a melhor das mulheres, mas também não pode
deixar de te amar, mesmo que para isso tudo faças


Catulo – Carmes LXXV –edição bilingue
Trad. e notas de Albano Martins
Editoralicorne.blogspot.com

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21/12/10

GOOD MORNING





http://www.youtube.com/watch?v=lzhSbBftWtk&feature=related

Para vencer qualquer escuridão...

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ESCREVER - 91

escrever


Dizer o mesmo com palavras diferentes, sempre o mesmo. Dizer sempre com as mesmas palavras uma coisa completamente diferente ou a mesma de modo diferente. Não dizer muitas coisas, ou dizer muito com palavras que nada dizem. Ou então calar de modo eloquente.

Hans Magnus Enzenberger,Opções para um poeta

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20/12/10

O PRAZER DE LER - 118

19/12/10

INESIANAS -20















Eu era moça, menina,

por nome Dona Inês de Castro,

e de tal doutrina e virtudes,

qu’era dina de meu mal ser ao revés.

Vivia sem me lembrar

que paixão podia dar

nem dá-la ninguém a mim:

foi-m’o príncipe olhar,

por seu nojo e minha fim. //

Dei-lhe minha liberdade,

não senti perda de fama;

pus nele minha verdade,

quis fazer sua vontade,

sendo mui formosa dama.

(...)

Das Trovas à morte de Dona Inês - de Garcia de Resende

excerto - texto completo em, por ex., http://triplov.com/poesia/garcia_de_resende/index.htm

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18/12/10

ROMANESCA



Para um dia contente ou simplesmente mais doce...
Alonso de Mudarra http://www.youtube.com/watch?v=jb16-__UqYo&feature=player_embedded

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17/12/10

PÉROLAS - 208

retratos

Canção

Levas um manto
de flores tecido;
a trama foi feita
de ouro aos fios;
as franjas atadas
por esta ternura,
finas, seguras
das minhas pupilas.

América do Sul, Quíchuas
Mudado para português por Herberto Hélder -in Rosa do Mundo

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16/12/10

OÙ QUE ME PORTE MON VOYAGE...



OÙ QUE ME PORTE MON VOYAGE LA GRECE ME BLESSE

Où que me porte mon voyage, / la Grèce me blesse /A Pilion, parmi les oliviers,/ la tunique du centaure / Glissant parmi les feuilles / a entouré mon corps / Et la mer me suivait pendant que je marchais//
Où que me porte mon voyage, la Grèce me blesse //
A Santorin en frôlant/les îles englouties / En écoutant jouer une flûte parmi les pierres ponces / Ma main fut clouée à la crête d'une vague / Par une flêche subittement jaillie / Des confins d'une jeunesse disparue//
Où que me porte mon voyage, la Grèce me blesse //
A Mycènes, j'ai soulevé les grandes pierres / et les trésors des Atrides / J'ai dormi à leur côtés à l'hôtel de "La Belle Hélène" / Ils ne disparurent qu'à l'aube lorsque chanta Cassandre / Un coq suspendu à sa gorge noire //. Où que me porte mon voyage, la Grèce me blesse //
A Spetsai, à Poros et à Myconos / les Barcaroles m'ont soulevé le coeur//
où que me porte mon voyage, la Grèce me blesse //
Que veulent donc ceux qui se croient à Athene / ou au Pyrée / l'un vient de Salamine / et demande à l'autre / si il "ne viendrait pas de la place Omonia" / "non, je viens de la place Syndagma" / repond il satisfait / "j'ai rencontré Yannis / et il m'a payé une glace / "Pendant ce temps la Grèce voyage / et nous n'en savons rien, / nous ne savons pas que, tous, nous sommes marins sans emploi / et nous ne savons pas combien le port est amer / quand tous les bateaux sont partis//
Où que me porte mon voyage, la Grèce me blesse //
Drôles de gensils se croient en Attique / et ne sont nulle part / ils achètent des dragées pour ce marier / et il se font photograhpier / l'homme que j'ai vu aujourd'hui / assis devant un fond de pigeons et de fleurs / laissait la main du vieux photographe, /l ui lisser les rides creusées / de son visage / par les oiseaux du ciel//
Où que me porte mon voyage, la Grèce me blesse //
Pendant ce temps, la Grèce voyage, / voyage toujours / Et si la mer Egée se fleurit de cadavres / ce sont les corps de ceux qui voulurent rattrapper à la nage / le grand navire//
Où que me porte mon voyage, la Grèce me blesse//
Les Pirée s'obscurcit / les bateaux sifflent, ils sifflent sans arrêt / mais sur le quai nul cabestan ne bouge /Nulle chaine mouillée n'a scintillé dans l'ultime éclat / du soleil qui décline//
Où que me porte mon voyage, la Grèce me blesse //
Rideaux de montagnes, archipels, / granites dénudés / le bateau qui s'avance s'apelle / Agonie ....

Georges Seferis, tradução de Jacques Lacarrière e Egérie Mavraki;dito por Melina Mercouri http://www.youtube.com/watch?v=ElIMcTS6xQw
ou http://www.dailymotion.com/video/x5ghkt_ou-que-me-porte-mon-voyage-la-grece_music

obs.: sei que já coloquei noutros sítios e muitos serão os que já conhecem. Mas gosto tanto que não resisti a colocar também aqui...

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15/12/10

A PARTIR DE HOJE NÃO LHE TRAREI FLORES

amor

flores

a partir de hoje não lhe trarei flores
apesar de inverno, lá fora podemos encontrá-las
florescem ainda aquelas resistentes ao frio

se lembra daquelas do último verão?!
que dentre as que murchavam havia
outras que surgiam coloridas?!
a vida assim não haverá que se dividir
porque em qualquer das estações sempre há flores
não se frustre em esperá-las

ao invés de lhe trazer flores
para ornar de cores sua beleza
ou tecer alguma coroa aos deuses
ou colorir uma revelação no altar divino,
vamos a elas nesta hora fria do dia
um frio que nem tão forte é que nos impeça de sair

fora de casa nada nos vem como prenda
o que nos vem é mais que isso
nada mais nos é do que vê-las
esquecemos de ter ou de receber
e nos despimos dos conhecimentos
de esperar raridades alheias
como hoje esperou por mim
pensando que traria uma rara flor

a partir de hoje não lhe trarei flores
vamos sair, chove muito pouco
um chuvisco apenas
vamos juntos, sabemos onde
nos esperam muitos hibiscos

jefferson bessa
http://jeffersonbessa.blogspot.com/

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14/12/10

DO FALAR POESIA - 121




Do filme O Carteiro,Il Postino - de Pablo Neruda
http://www.youtube.com/watch?v=fbTmmx_579A&feature=related

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13/12/10

DA EDUCAÇÃO - 65

"Os professores ideais são aqueles que se usam a si mesmos como pontes, sobre as quais convidam os seus alunos a atravessar, e, depois, tendo-lhes facilitado a travessia, alegremente se abatem, encorajando-os a criar pontes deles próprios."

Nikos Kazantsaki

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12/12/10

AFRONTAMENTO - 44

aves

Cantilena


Cortaram as asas
ao rouxinol.
Rouxinol sem asas
não pode voar.

Quebraram-te o bico,
rouxinol!
Rouxinol sem bico
não pode cantar.

Que ao menos a Noite
ninguém, rouxinol,
ta queira roubar.
Rouxinol sem Noite
não pode viver.

Sebastião da Gama

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11/12/10

POEMAS COM ROSAS DENTRO - 90

rosas

as rosas amarelas de novembro

o que havia naquele tempo eram pássaros cinzentos
morrendo nas rosas de novembro
eu não conhecia o corte frio das palavras
ardendo no fogo ou desenhando-se na cal das paredes

era novembro nos gatos alinhados ao sol
misteriosos pretos recebendo-o
o lume era o lume
uma canção de outono era um fruto
doce e estranho
um fruto perdido e profundo
a boca tinha ainda a chama do leite

a morte era velha como a casa ou os pássaros cinzentos
morrendo no outono de novembro


mas havia ainda -
as rosas amarelas de novembro
uma lembrança
nos olhos de as ver repetidas nas muitas vezes contadas
em casa
no centro dos desastres
no cerne dos acontecimentos

José Ribeiro Marto
http://vaandando.blogspot.com

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10/12/10

PARA LIU XIAOBO -LEMBRANDO O MAIS BELO TEXTO DO MUNDO






Liu Xiaobo,Prémio Nobel da Paz de 2010

Considerando que......


Proclama a presente Declaração Universal dos Direitos do Homem como ideal comum a atingir por todos os povos e todas as nações, a fim de que todos os indivíduos e todos os órgãos da sociedade, tendo-a constantemente no espírito, se esforcem, pelo ensino e pela educação, por desenvolver o respeito desses direitos e liberdades e por promover, por medidas progressivas de ordem nacional e internacional, o seu reconhecimento e a sua aplicação universais e efectivos tanto entre as populações dos próprios Estados membros como entre as dos territórios colocados sob a sua jurisdição.

Artigo 1.º


Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade.

.....
Artigo 3.º

Todo o indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.
.....


Artigo 13.º

1..........Toda a pessoa tem o direito de livremente circular e escolher a sua residência no interior de um Estado.
2. ........ Toda a pessoa tem o direito de abandonar o país em que se encontra, incluindo o seu, e o direito de regressar ao seu país.


Toda a pessoa tem direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião; [...]
.....


Artigo 19.º

Todo o indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, o que implica o direito de não ser inquietado pelas suas opiniões e o de procurar, receber e difundir, sem consideração de fronteiras, informações e ideias por qualquer meio de expressão.
[......]


Organização das Nações Unidas, em 10 de Dezembro de 1948

Hoje é entregue em Oslo o Prémio Nobel da Paz, o mais nobre de todos os Nobeis - a Liu Xiaobo , jornalista, preso por ter solicitado reformas democráticas no seu País, a China, membro permanente do Conselho de segurança da ONU - em clara violação dos direitos que também subscreveu ao assinar esta declaração, em 1958.Mantido em prisão efectiva de 12 anos não poderá ir receber o seu Prémio, nem fazer-se representar por sua mulher, em prisão domiciliária, ou seu filho, a quem não foi concedido visto para se ausentar.
Parabens, Liu Xiaobo! tens o mundo livre contigo!

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09/12/10

POETAS MEUS AMIGOS - 142


autores
img:ítaca


Um Homem Deseja Ir, Um Homem Deseja Voltar

Tantas vezes coube o céu em meus olhos
que o próprio céu se mudou em raiz
saída da fundura mais doída.
Entrava nova estação e eu sabia
que luar a cingiria e qual fogaréu
traria as cinzas do dia futuro.
Era belo, mas também magoava
e dessa mágoa somada ao encanto
e desse encanto onde cantos eu
buscava vinham a idéia de que Ítaca
era minha e era o que me bastava.
Em Ítaca, mar e céu são inteiros.

Mas Ítaca não existe se não
existe casa para trás deixada.
Preciso é que a distância se desdobre
não em algo maior ou nunca visto
mas em algo que o sangue não conheça
como seu, ainda que imagens gêmeas
sejam dos muitos dias repetidos.
Eis o luar, e o lusco fusco,
e a luz embebida em luz, fogo leve,
não diferente da brandura de abril
embora lá seja fim de setembro,
quando as folhas ainda não morreram
e o mar ainda devolve crianças.

Um mundo multiplicado em espelhos
é imenso ou é repetição?
Longe, encontrei beleza que aqui
não existe, mas o que me aturdiu
é que o pólen de todo o coração
é soprado por um único deus
ou é vestígio de única ruína.
Longe, outras ítacas encontrei
e quanto mais eu as tornava minhas
mais a casa deixada para trás
era dor que ia do vermelho ao branco
e do branco ao vermelho juvenil.
O mundo multiplicado em espelhos
é distorção porque o centro perdeu
e um homem que se perde do seu centro
é a aventura do retorno, entre ítacas
derruídas e ítacas do porvir.

Daniel Francoy
http://oceuvazio.blogspot.com/

O Daniel publicou recentemente, em, Portugal, o livro Em Cidade estranha - ed.Artefacto, 2010 - http://www.eartefacto.blogspot.com/;artefacto@gmail.com

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08/12/10

FLORBELA ESPANCA - AMAR PERDIDAMENTE

EVOCAÇÃO DE FLORBELA ESPANCA

«Eu sou insaciável; mal um desejo surge, outro desponta, e em mim há sempre latente a febre do sonho e do desejo, e quando possuo alguma coisa de infinitamente consolador, como é a sua amizade, desejo mais, mais ainda, mais sempre! Conhece-se em mim o afecto, o amor, a ternura por um egoísmo implacável que quer tornar muito meus, e só meus, os corações que se me dedicam um pouco. Dá isto muitas vezes o resultado de me suceder o mesmo que sucedeu ao cão que largou a presa pela sombra, pois querendo muito, muito perdeu.»


Florbela Espanca
lembrada em
http://cortenaaldeia.blogspot.com/

Obs:Florbela da Conceição Espanca (1894 - 1930) nasceu e voluntariamente morreu em 8 de dezembro, dia dedicado a N.Srª da Conceição, sua patrona. Vida afectiva atribulada.
Uma das grandes sonetistas portuguesas do século passado

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07/12/10

OS MEUS POETAS - 195

aves

Quase

Um pouco mais de sol - eu era brasa,
Um pouco mais de azul - eu era além,
Para atingir,faltou-me um golpe de asa...
Se ao menos eu permanecesse aquém...

Assombro ou paz? Em vão...Tudo esvaído
Num baixo mar enganador de espuma;
E o grande sonho despertado em bruma,
O grande sonho - ó dor! -quase vivido...

Quase o amor,quase o triunfo e a chama,
Quase o princípio e o fim - quase a expansão...
Mas na minh'alma tudo se derrama...
Entanto nada foi só ilusão!

De tudo houve um começo...e tudo errou...
- Ai a dor de ser quase,dor sem fim...-
Eu falhei-me entre os mais,falhei em mim,
Asa que se elançou mas não voou...

Momentos de alma que desbaratei...
Templos aonde nunca pus um altar...
Rios que perdi sem os levar

Se me vagueio,encontro só indícios...
Ogivas para o sol - vejo-as cerradas;
E mãos de herói,sem fé,acobardadas,
Puseram grades sobre os precipícios...

Num ímpeto difuso de quebranto,
Tudo encetei e nada possuí...
Hoje,de mim,só resta o desencanto
Das coisas que beijei mas não vivi...
.....................................................
......................................................

Um pouco mais de sol - e fora brasa,
Um pouco mais de azul - e fora além.
Para atingir faltou-me um golpe de asa...
se ao menos eu permanecesse aquém...

(Paris,13 de Maio de 1913)

Mário de Sá Carneiro

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06/12/10

OMNIA VINCIT AMOR - 154

amor


O amor, umas vezes voa, outras anda; com este corre, com aquele vai devagar; A uns refresca, e a outros abrasa; A uns fere, e a outros mata; Num mesmo ponto principia a carreira dos seus desejos, e ali mesmo os acaba e conclui; Pela manhã, costuma colocar cerco a uma fortaleza, e à noite a leva de vencida, porque não há força que lhe resista.

Miguel de Cervantes

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05/12/10

NOCTURNOS - 91













Desprotegida a noite foi assaltada por memórias
Azul profundo
Carmim
Amarelas
Seus braços abertos se encheram de sono
Seu cabelo solto de vento
Seus olhos de silêncio.



Odysseus Elytis, Sete Nocturnos (5)
(trad. Mário Cláudio)

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04/12/10

BUSQUE AMOR NOVAS ARTES, NOVO ENGENHO

03/12/10

LEITURAS - 153













«Lá vai o português, diz o mundo, quando diz, apontando umas criaturas carregadas de História que formigam à margem da Europa.
Lá vai o português… lá anda. Dobrado ao peso da História, carregando-a de facto, e que remédio – índias, naufrágios, cruzes de padrão (as mais pesadas). Labuta a côdea do sol-a-sol e já nem sabe se sonha ou se recorda. Mal nasce deixa de ser criança: fica logo com oito séculos.
No grande atlas dos humanos talvez figure como um ser mirrado de corpo, mirrado e ressequido, mas que outra forma poderia ele ter depois de tantas gerações a lavrar sal e cascalho? Repare-se que foi remetido pelos mares a uma estreita faixa de litoral (Lusitânia, assim chamada) e que se cravou nela com unhas e dentes, com amor, com desespero, ou lá o que é. Quer isto dizer que está preso à Europa pela ponta, pelo que sobra dela, para não se deixar devolver aos oceanos que descobriu, com muita honra. E nisto não é como o coral que faz pé firme num ondular de cores vivas, mercados e joalharia; é antes como o mexilhão cativo, pobre e obscuro, já sem água, todo crespo, que vive a contra-corrente no anonimato do rochedo. (De modo que quando a tormenta varre a Europa é ele que a suporta e se faz pedra, mais obscuro ainda).
Tem pele de árabe, dizem. Olhos de cartógrafo, travo de especiarias. Em matéria de argúcias será judeu, porém não tenaz: paciente apenas. Nos engenhos da fome, oriental. Há mesmo quem lhe descubra qualquer coisa de grego, que é outra criatura de muitíssima História.
Chega-se a perguntar: está vivo? E claro que está: vivo e humilhado de tanto se devorar por dentro. Observado de perto pode até notar-se que escoa um brilho de humor por sob a casca, um riso cruel, de si para si, que lhe serve de distância para resistir e que herdou dos mais heróicos, com Fernão Mendes à cabeça, seu avô de tempestades. Isto porque, lá de quando em quando, abre muito em segredo a casca empedernida e, então sim, vê-se-lhe uma cicatriz mordaz que é o tal humor. Depois fecha-se outra vez no escuro, no olvidado.
Lá anda, é deixá-lo. Coberto de luto, suporta o sol africano que coze o pão na planície; mais a norte veste-se de palha e vai atrás da cabra pelas fragas nordestinas. Empurra bois para o mar, lavra sargaços; pesca dos restos, cultiva na rocha. Em Lisboa, é trepador de colinas e de calçadas; mouro à esquina, acocorado diante do prato. Em Paris e nos Quintos dos Infernos topa-a-tudo e minador. Mas esteja onde estiver, na hora mais íntima lembrará sempre um cismador deserto, voltado para o mar.
É um pouco assim o nosso irmão português. Somos assim, bem o sabemos.Assim, como?[...]

José Cardoso Pires, E Agora, José?

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02/12/10

LER OS CLÁSSICOS - 135















Não sei se a raiva é coisa dura,
nem tenho intento de o saber;
mas sei que amor, que pouco dura,
é bem difícil de sofrer.
Nome de amor nem deve ter:
antes de flor, ou de verdura,
visto passar tão a correr...


Nome de flor, ou de verdura,
no coração do meu amante:
dentro do meu, por desventura,
chamei-lhe Rocha, ou Diamante

- pois é tão forte e tão brilhante
que nem a própria sepultura
me há-de tornar menos constante.


Clément Marot
Fotografia: Marina Cano

lido em http://aldinaduarte.blogspot.com

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01/12/10

Ôba! Você disse 235 000?

Saúdo cada um/uma dos 235 000 remadores * - excelentes companheiros de viagem neste barco de flores

*mais, neste momento, 17...

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DO FALAR POESIA - 91











Fênix

“toda arte almeja alçar-se à condição de música”*
Entre palavra e música
Existe um ex-pássaro
Aquém-chamas:
Poesia.

Antônio Adriano de Medeiros
(*) a frase citada é de Walter Pater, crítico inglês do século XVIII

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